sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

O TEMPO E OS OLHOS

O TEMPO E OS OLHOS
Oswaldo Antônio Begiato

minhas mãos
como eu
estão velhas e empacadas

o tempo
foi me levando aos poucos
e me deixando aqui só
com a pele solta
e os olhos míopes

não encontro meu semblante
entre as rugas

mal consigo enxergar
a mim mesmo
no espelho

a vida
é tão sacana
que nos colocou
no rosto
um monte de músculos
para nos fazer chorar
e poucos
para nos fazer sorrir

o riso, portanto, é coisa rara

a lágrima constante e doída

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

SONHO AO SOM DO MAR



SONHO AO SOM DO MAR
Oswaldo Antônio Begiato

Sonhei com você esta noite.

Tinha a seu lado um recém-nascido terno,
Lindo como sua testa séria,
Limpo como suas vestes brancas,
Sereno como suas renúncias.

Ele tinha olhos verdes e claros
Como a luz do sol, logo pela manhãzinha,
Penetrando o mar de Ubatuba,
Mesclando algas, o azul e a profundidade.

O menino era tão lindo! Você estava tão linda!

Trazia nos braços flores transparentes,
No colo uma cicatriz de estrelas,
No sorriso um futuro de caminhos retos
E uma porta que me convidava à sua alma.

Você me chamou para junto de ti com mãos de chegança.

Quando eu, incrédulo, lhe sorri uma promessa etérea
Seu corpo esvaneceu-se delicado entre as horas
Lançando-me para fora de minhas paredes foscas
Entre um soluço de dor e um pedaço de impotência.

Despertei carinhosamente triste.

Despertei com as mãos entre o espírito e a carne.

domingo, 20 de setembro de 2015

CANTIGA DE CRIANÇA

CANTIGA DE CRIANÇA
Oswaldo Antônio Begiato

Se essa lua
Fosse minha
Eu mandava
Ladrilhar
Com ladrilhos
De Portugal
Só para
O meu amor passar...

Mas quem passou
Foi o dragão
E levou o meu amor 

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

DIA DOS PAIS

DIA DOS PAIS
Oswaldo Antônio Begiato

Ouvido atento
duvido do vento
nas horas de honras.

Cadeira de madeira,
mágoa d’ água,
braço de aço.

A morte
não chega
antes do tempo.


Nem depois.

sábado, 11 de julho de 2015

DIQUE

DIQUE
Oswaldo Antônio Begiato

Quando eu pensar em ti
E minha boca se esgotar em saudades,
(Tu sempre saberás com uma eternidade de antecedência
quando minha boca estiver se rompendo de saudades)
Venha!

Venha e venha logo, mulher!
Tu não sabes o quanto sofro nessas horas,
De mais sincera angústia,
Com tua ausência inexplicavelmente infinita,
Infinitamente inexplicável.

Há uma dor que vem de dentro de meus vulcões,
Corrói toda sanidade que trago nos olhos
E jorra boca afora como se fossem serpentes
Se misturando às minhas multiplicadas línguas,
Línguas na saudade estupidamente esculpidas.

São beijos quentes e não dados
Que o tempo acumulou nos bueiros que me habitam
E meu corpo não suportou conter dentro de si,
Brasas que são à busca do oxigênio de seu hálito.

Quando eu pensar em ti, pois,
E minha boca se esgotar em saudades,
Venha e venha logo, mulher,
Com a boca dilatada e afogada em generosidades,
Porque só tu podes hospedar
Os beijos que eu nunca quis que fossem de mais ninguém.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

CLAUSURA

CLAUSURA
Oswaldo Antônio Begiato

Mais doído do que
Amar e não ser amado
É sair da clausura interna
E descobrir conventos misteriosos.

Sair dos conventos
E descobrir catedrais despojadas.

Sair das catedrais
E matar todos os deuses céticos.

E depois voltar à clausura interna
Como homem envelhecido pelas dores
Provocadas pelo rasgar d’alma.

domingo, 5 de julho de 2015

ASSOMBRAMENTO

ASSOMBRAMENTO
Oswaldo Antônio Begiato

Quando te vejo
Encho a boca de cadeados
E os olhos de chaves,
Aprisiono-me nos encantamentos

E morro encharcado de horizontes.

sexta-feira, 10 de abril de 2015

HAICAIS

MAR E AMOR

Onda fragorosa.
De porre também se morre;
Ressaca amorosa.


TERNO E SILENTE

Pacto silencioso
No olhar no olho quando amar.
Momento precioso.

MANUEL

Assim tão menina,
Estrela, quem há de tê-la?
Noite pequenina.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

FINADOS

FINADOS
Oswaldo Antônio Begiato

Ninguém deveria ter seus parafusos
E porcas
E neurônios soltos
Por conta de estradas ruins
Que a vida constrói para nossa viagem.

Ninguém deveria perder nada;
Nem cabelos,
Nem olhos,
Nem a vista,
Nem o juízo.

Ninguém deveria adoecer.

Ninguém deveria sofrer a dor do envelhecimento.

E a morte deveria ser
Como se fosse a composição de nosso sonho final.


Serena como o amanhecer na primavera.